OS ANJOS, Renato Russo

Quando a Legião Urbana apareceu nos anos 80 foi muito legal. O rock estava de volta à midia, e com dignidade. Muitos passaram a considerar o Renato Russo um poeta. Hoje, vez por outra, ouço alguma crítica ao compositor dizendo que ele não era um bom letrista, ou seja, que suas letras não eram poéticas.

Talvez, a confusão toda esteja na ideia do que é poético. Acredito que a poesia do Renato Russo esteja mais próxima à ideia de força da palavra, a comunicação direta, ao dizer o que se pensa, e isso para muitas pessoas é poesia. O que o coloca na linha poética dos grandes pensadores do rock, como Dylan e Lennon.

No Brasil, não sei de onde vem isso, temos uma tradição intelectualizada de poesia. Aqui, para ser poético, mesmo uma canção popular, a palavra deve conter um ar de mistério, não pode dizer. A música do Renato não é assim. Ela diz. E diz forte. E nessa força está sua carga poética. É um grito, por vezes uma doçura, que muitos entendem. E por representar, torna-se metáfora, faz-se linguagem afetiva; daí temos a poesia, porque emociona, divide dor e revolta.

Não importam os conceitos. Acerto aqui que é poesia porque faz o mundo se deslocar. Causa espanto, como diz Ferreira Gullar.


Leia um trecho da canção OS ANJOS, Renato Russo dá a receita de como fazer um país que é prato cheio para corruptos e aproveitadores:

"Pegue duas medidas de estupidez
junte trinta e quatro partes de mentira
coloque tudo numa forma
untada previamente
com promessas não cumpridas

adicione a seguir o ódio e a inveja
às dez colheres cheias de burrice
mexa tudo e misture bem
e não se esqueça: antes de levar ao forno
temperar com essência de espírito de porco
duas xícaras de indiferença
e um tablete e meio de preguiça"

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